EnjoyYourLife

sexta-feira, outubro 20


Luzes, Cérebro, Acção!!!!

Non existing File!!!

Há coisas que se passam na minha vida de que não tenho memória…

Pus a chave do carro num qualquer canto, entrei em casa, segundos esquecidos.
Arrumações, por todo o sítio, mudei tudo de todos os lugares. Abri gavetas, fechei caixas, desarrumei memórias, bebi sabores de futuro, alimentei-me, li olhos, li palavras de gosto. Fiz cara de espanto, mandei mensagens, recebi respostas trocadas. Fui e voltei. Caí cansada no último dia de sofá. Sonhei, que faltavam poucos segundo, ouvi os hinos que sempre me inspiram o voo. Madruguei, despertei, vesti o vestido de encantar, apertado na cintura, calcei os sapatos de salto que me dão a perspectiva de dia na minha medida exacta.
Preparo a minha mala para sair. Estou pronta para a película de hoje.
Luzes, câmara, acção!
Onde está a chave do meu carro? Procuro e procuro em todos os prováveis locais. O que faço quando não encontro no provável o que quero? Mergulho para improvável. Eu sei que ela existe. Já a vi, ainda ontem estava aqui. Não desisto nunca, porque sei que ela existe, via-a.
E se não a tivesse visto, ela não existia? Se a tivesse apenas imaginado? Se tivesse imaginado como seria a chave do meu carro, ela não existiria algum dia? Desistiria eu de a encontrar?
Desmontei a casa inteira. Arredei os móveis para cá, para lá, numa dança confusa no espaço. Fui para a rua, procurar na calçada dos arredores, andei pelo mesmo trajecto, bati a portas, perguntei a estranhos. Ninguém, ninguém a tinha visto. Será que isso viria provar a teoria de que a chave não existe?
Volto para casa por outro caminho, com outra ideia.
Sento-me desesperada, respiro, acalmo-me. Converso por dentro e concluo que foram apenas uns segundos de que não me lembro. Não me lembro da minha mão a agarrar na chave e a guardá-la. Dou uma gargalhada, quando percebo que foi apenas isso, alguns segundos que não guardei na minha caixa de ligações complexas. Surgiu-me a ideia de que fui eu própria a realizadora do filme do esquecimento. Que processo utilizei, para não ter memória deste instante da minha própria vida?

Take 2 11:45 Luzes, cérebro acção!!!
Existing File!!!


Aumento o espaço do cenário. Ponho-o mesmo grande.
Espaço do novo cenário: Casa - dentro, por baixo e de trás de todos os móveis – calçada – prédios vizinhos – dentro do carro.
Cenário construído!

Actriz principal, eu própria. Sento-a frente ao espelho, ponho-lhe a base como de costume, para um bronzeado que lembra o sol gostoso, acentuo-lhe os lábios carnudos, o olhar indiscreto, curioso e sobretudo acentuo-lhe os traços de observadora. Ela sorri, como que a dizer-me que está prepara para este take. Retiro definitivamente do vocabulário o impossível e o tom abrupto. Lembro-lhe, por dentro do ouvido, baixinho, que ela é extraordinária e juntas reestruturámos o guião. Tudo vai ser filmado com detalhe e se mesmo assim os segundos não aparecerem na memória, podemos sempre mandar vir outra chave, que vá se lá saber porquê, viria de França dentro de semanas.
Grande plano, mais luz, mais luz, mais cor, mais brilho.
ACÇÃO!
Entra pela rua adentro, estaciona o carro mesmo em frente. Sai do carro com os ombros levantados. Pega em todos os sacos, fecha a porta, sobe, enquanto se olha ao espelho do elevador. Tira a chave da porta, abre, pousa os mil e quinhentos sacos e uff. Mais brilho, mais luz, mais cor, mais movimento. A realizadora, mistura-se na mesma matéria da actriz.
Ponho uma música, descontraio, danço.
Sinto qualquer coisa pendurada ao meu pescoço que sussurra e faz festas ao meu coração, olhei-me e aqui estava ela, sempre comigo. Eu é que não a tinha visto. Sempre esteve aqui, pendurada ao meu peito, junto com um Original Lanyard que diz enjoy your life. Recuperei os segundos. Riu e abraço a vida, pulo de contente e mando beijos aos que me disseram que não a tinham visto também. Planeio novamente o dia com outra energia.

Assalta-me outro pensamento…

E o que poderei fazer com as memórias que não quero que pertençam ao meu universo?
Pareceu-me importante, pensar nisto. Como seria a vida, o presente, o futuro e o passado se retirar o sumo e guardar apenas o que aprendi. Como seria eu, se assim fosse?


No More Existing File

Pego num lápis e num papel, aponto toda a parte mecânica do processo, todas as linhas e virgulas que me levaram a encontrar a chave. Viro o papel do avesso, volto-me para trás. Reduzo o plano à imagem estática que quero eliminar, desfoco a máquina, apago a luz. Reescrevo o guião, com novas metáforas, palavras de brilho, penteio todos os despenteados, vivo.

Comemoro de novo. Encontrei a minha chave.

Ummmm!!! Bom dia!